domingo, 28 de julho de 2013

Ode ao amor

Escrevo essas linhas tortas
Certo que abro as portas
Para o grito d'alma sair

Longe de ter vindo do céu
Não pôde reter-se ao corpo
E se derrama incerto no papel

Tuas palavras são flerte
Enchem de brilho o olhar
Tudo que é vida, irão declamar
Pelo meu corpo que jaz, inerte

Queria eu dominar esse jogo
Que de mim só retira
Queria eu poder captar em ti
Toda a luz que me inspira

Queria eu repassar,
Sem que meus versos
Me sejam incertos
O que inquieta o peito

Sim, queria...
Mas isto já não seria possível
Tampouco me é palpável
Nomear tais devaneios

Ainda assim, reluto
Nesse sopro de emoção
Esvai incerto intento último
De descrever teus encantos

De resto, não reclamo
Ainda que faltem palavras plenas
Sem que precise conjugar
Me basta sentir que amo.

sábado, 25 de maio de 2013

Bela

A noite é bela,
Desfaz os medos, os ascos
Retira a luz dos cacos 
Da vida que não nos resta


No brindar dos copos
No entrelaçar dos corpos
Faz-nos romper com ilusões terrenas
Faz despertar as paixões diversas

A noite é rara,
Pouco escapa da sobriedade
Pouco se liberta do dissabor diurno
Pouco, muito pouco...

Mas há de haver noite,
Ao menos em algumas noites
Para estancar esse samba dolente
Para embriagar-nos de felicidade

E certa vez, houve noite
Uma bela noite.
Bela, talvez a mais bela
Das noites.










segunda-feira, 8 de abril de 2013

A carne

A superfície é plena
Dela, se olha as estrelas
E do mar, se esculpem as maneiras
Que permeiam a tua cama

Da carne, tudo se enleva
Enxerga os olhos
Na vitrine eterna
E seduz o peito
No caminhar errante

Da lua, tudo é distante
A sup­­erfície é distante
No entanto, dana a brilhar:
Cintila a luz
Que da alma impele o olhar
Derrama o pó
Que encobre a dor
Desfaz o ser
Que arde em estar

Pro tempo, a carne se nega
Reduz a vida
À lembrança terrena
Em tempo, a carne revela
Chama vil que a renega
Impõe ao peito
A realidade erma
Consome a cor
Da superfície plena

Do tempo, pouco se espera
A superfície, a lua, o mar,
Desdobramentos ébrios
De uma carne a pensar:
Tampouco se sabe
E de tudo se tenta
À luz de um derradeiro olhar:
Pro tempo, a carne se nega
Da carne, tudo se enleva.





quinta-feira, 14 de março de 2013

E agora, João?


Não me venhas andar, nas esquinas de bar
Não me sejas assim, o inconveniente porém
É recair sobre o bem os desvios do teu mal

Me forças a agir, deste jeito não podes ficar
Meu querido João, como pude deixar?
Seria horrível pensar, neste fim bestial
Que escolhas me deixa afinal, se não lhe amaldiçoar?

E nada tema João, basta curar-te
E as portas do lar estarão abertas à ti
Por hora há lodo e rua a te esperar, mas entenda João,
A mim me dói mais que a qualquer outro
O desgosto de tua perdição

João acorda:

Oh, não! Não... Não há mais como fugir
Se há neste chão um declamar tão vil,
Se há por detrás destas paredes murmúrios de desaprovação
Se julgam haver infâmia em meu leito,
Julgo não encontrar aqui meu lugar

[Entra no saguão]Ouçam-me agora, minha escolha é muito clara
Não me venham com honras, tratados, migalhas
Há aqui dois espécimes do que achas mais repugnante
E não nos olhe com esta face de horror,
Afinal trata-se apenas de amor

João se cala; a voz retorna:

Como ousas João, em pleno louvor
Frente a imagem do criador, o desafiar?
Promíscuo! Abjeto! Flagelo destes tempos atroz!
Não te passas que causa apenas vergonha a nós?

Como ousas João, retribuir tanto amor
Tanto ouro por tamanho horror? Custa-me acreditar...
Nego-lhe tudo: o prato, o manto, o copo, o ar.
Já me basta fitar a desfaçatez ardente de teu olhar!

Apresse-se pois, não mais nos fará mal,
Retirá-lo-ei de todas as memórias
Matá-lo-ei no jornal local
Que reste apenas a desonra
Que calado fique até seu final.

Silêncio....
Silêncio.
Silêncio!?

Acorda o parceiro de João:

E agora, João?
Só há a rua a trilhar
Como ainda pode esperar
Um novo Sol nascer?

Repito João,
Não irei te deixar
Aprendi a viver neste chão
De descaminhos iremos nos guiar
Em vão...

Ah, meu João
Ande, dá-me tua mão
É preciso dançar o cordel
Essa vida regrada a bordel
É o que nos restará

Ah, João!
Soubessem o quanto há ironia em tudo
Soubessem o pouco que lhes falta muito
Que temos, senão Amor?
Que vos falta, senão Amor?










  



terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Um dia inclinou sobre teus olhos ternos
Em incidência imagem de uma escuridão
E recostou seus lábios noutra boca pálida
Silenciada por um possível fim

Espelho do meu rosto os céus refletiam
Um turvo horizonte em precipitação
Nele precipitavam as lágrimas retidas
Em meu peito ébrio de aspirações

Reconhecidamente meus ouvidos captam
O que minhas palavras dizem não ouvir
E aparentemente meu temor se acaba
Por nos braços teus poder me iludir

E para meus sentidos a ilusão desperta
Lembrança que eu nunca quis
Recriar o medo de uma estrada incerta
E me contradizer sendo feliz

Mas novamente enxergo braços abertos
Dizendo que o tempo há de esperar
Recria a crença de noites eternas
E da felicidade me faz duvidar

Só há felicidade junto aos passos teus
E a felicidade longe aos passos teus?
Longe, em tempo, dirá o tempo
Em estrofe única o que virá